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Coluna da Magnólia - SÉRIE DIREITO E CINEMA: ANÁLISE JURÍDICA DO FILME “A VILA”




(É extremamente recomendável ver o filme ou ler a sinopse antes de ler)
O que é o Medo?
O medo é um limite, tal como a floresta do filme. O medo se desconstrói quando o enfrentamos, como aconteceu com a personagem que atravessou a floresta.
Entretanto, o medo pode ser criado. Assim foi durante a propaganda nazista, em que uma grande leva de filmes e publicidade foram criadas com finalidade de criar o medo de uma ameaça comunista, com direito a cartazes com desenho de demônios que devoram criancinhas, e coisas piores.
O medo é criado pela mídia televisiva atual, que explora a criminalidade de forma irresponsável, pondo o pobre como um câncer social que deve ser aniquilado, fomentando uma sociedade que fecha os olhos para um problema estrutural baseado em carência de políticas públicas, alimentação, moradia, educação extremamente deficitárias. Assim acontece com a vila do filme: o medo é criado por um grupo de pessoas a fim de manter a ordem. As pessoas não aceitam determinado tipo de sociedade, e vão morar em uma vila, entretanto, tem medo que seu projeto, que seu ideal do que é mais apropriado para se viver seja desrespeitado.
Assim usam como ferramenta o medo. Um medo destorcido e infundado. Nesse sentido o medo “cega”. Impede o ser de ver novos horizontes, novas possibilidades que poderiam ser melhores sob seu ponto de vista. Impede o direito de escolha, o livre arbítrio.
Curiosamente, a personagem que enfrenta a floresta é uma cega. Não no sentido conotativo mas no sentido denotativo. Talvez o fato de não ver tenha despertado uma sensibilidade diferente dos outros moradores da vila, todos amedrontados.
Em suma, o medo pode ser uma ferramenta de controle de alguns sobre outros. O fato de a cor vermelha ser proibida na vila (esta representa sentimentos como revolta e paixão) é prova do controle ali estabelecido. Em contraponto, a cor amarela é bem vista na comunidade, e que protege os indivíduos das criaturas. Porém seu significado é extremamente contraditório ( liberdade e medo), o que reafirma a opressão de um grupo de sobre outro.
Nesse ponto, que se refere a cor amarela, fez-se referencia ao livro “O Leviatã” de Hobbes. No livro de Hobbes, os indivíduos abriam mão de uma parcela de sua liberdade, entregando-a ao Estado, em nome de viverem em segurança. Ou seja, abriam mão da liberdade para que o Estado pudesse punir e para que os indivíduos saíssem do estado de natureza, onde praticamente tudo era permitido.
Noah sabia que não havia criatura nem perigo algum na floresta. Ostenta a cor vermelha, e ri dos ruídos que amedrontam a todos, como se gabasse de um falso status de coragem. Entretanto, Noah nada dizia a ninguém, pois se alguém soubesse que as criaturas não existiam, a sociedade poderia se desfazer.
Pode-se traçar um paralelo com a atualidade: os detentores do conhecimento, os intelectuais, que sabem da manipulação midiática a fim de esconder reais problemas sociais, que sabem das confabulações por trás de uma sociedade opressora, para que o mesma pareça natural e inofensiva, quase sempre nada fazem para mudar o cenário dessa sociedade, pois são pressionados pelo própria, que é muito mais poderosa em termos ideológicos, militares e econômicos do que qualquer grupo de indivíduos organizados.
Quando Noah começa a apresentar uma ameaça a sociedade – e aí se faz uma alusão às Revoluções – ele é massacrado pelos que queriam manter a sociedade.
Uma outra observação é que Noah é visto como “louco”. Ser louco é não se adaptar aos parâmetros de uma sociedade, e portanto, apresentar ameaça. No caso, a sociedade isolada da vila que o padronizou como louco e nocivo. Tal analise leva a uma reflexão de que existem diversas culturas e que a moralidade em cada uma delas é relativa, porém, quem dita essa moralidade nem sempre tem as melhores intenções.
Em uma perspectiva simples, é como se Noah , em uma visão hobbesiana, descumprisse o contrato dedar ao Estado parcela de sua liberdade, em nome de viver em segurança e acabou punido por isso.
Todo ancião possuía em sua casa uma caixa preta. Essa caixa preta guardava o passado deles. Que com a constituição da vila, havia virado criminoso. Logo nessa caixa se encontravam as paixões que Hobbes dizia ter o homem em estado de natureza (ira, maldade, inveja e outras). Essas paixões segundo Hobbes tornavam o homem ruim por natureza. É como se a caixa estivesse relacionada a cor vermelha dentro da vila; a cor que traz sentimentos e fatos negativos.
A personagem Ivy decide ir a cidade buscar remédios para seu namorado Lucius, movida pelo amor. Logo, cometeria um crime. Entretanto o pai de Ivy, um ancião, sabia que nada a ela aconteceria, pois não existia criatura ou mal algum na floresta.
Interessante que Ivy é cega; não vê as criaturas, mas tem elas criadas em sua mente, e as teme. Essa talvez seja uma crítica do filme. O medo é um sentimento e não necessariamente uma realidade. E mesmo que não seja realidade, pode paralisar uma pessoa. Isso torna o medo uma interessante ferramenta de controle de uns sobre outros. Algo paralelo a sociedade atual.
Ivy usava uma capa amarela para se proteger, e a capa amarela representava medo versus liberdade, sentimentos totalmente antagônicos. Ao usar a capa Ivy ainda sim se sentia paralisada, porque entre esses dois sentimentos destoantes, o medo predominava. Após matar uma das criaturas, que na verdade era Noah, ele perde o medo, e se livra da capa, atravessando a floresta.
O filme mostra que e impossível viver em uma comunidade em que não haja sentimentos maus e bons, pois estes são advindos do próprio ser humano. As paixões são incontroláveis, e portanto, o crime existirá sempre, desfazendo a Vila a qualquer momento.


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