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CONFUSÃO, MANIFESTAÇÃO, PROTESTO, POLITIZAÇÃO E CRIMINALIZAÇÃO - Por Waldeci Ferreira Chagas


Nenhum discurso é isento, ingênuo, e descomprometido; afinal discursos são frutos de lugares sociais, políticos, e culturais, portanto, tem uma intenção, sobretudo, porque advém de diferentes instituições e por isso, assumem sentidos, servem a uma ordem e colaboram com a construção de ideias a respeito de fatos, personagens e lugares. São várias as instituições sociais e políticas que cotidianamente constroem discursos e representações, sutilmente repassados e levam as massas a formar uma opinião.

Dentre as instituições produtoras de discursos e representações os meios de comunicações de massas, principalmente as TVs com os Telejornais são eficiente e recorrentes nesse processo, haja vista o telespectador ao contatar com a notícia, ainda que a questione não dispõe de tempo e espaço na mesma rapidez com que é apresentada para questiona-la e permitir ao enunciador refazê-la. Quando se comete um deslize num telejornal no máximo na edição apresentada se corrige um termo, uma data, um lugar ou o nome de um personagem envolvido no fato narrado, mas nunca o teor do que fora narrado. Ou seja, o sentido da notícia permanece e leva o telespectador a conceber a verdade; geralmente única e inquestionável, principalmente porque ele não assiste a vários jornais em diversas emissoras, o que deveria, mas poucos fazem isso. 

Enunciada estas ideias, vou ao fato que me inspirou ou instigou a escrever CONFUSÃO, MANIFESTAÇÃO, PROTESTO, POLITIZAÇÃO e CRIMINALIZAÇÃO, e assim tecer alguns comentários sobre o discurso da imprensa brasileira quando as notícias são os protestos populares na contemporaneidade. 

 A tempo tenho prestado atenção a esse comportamento advindo de um segmento da imprensa, principalmente porque assisto assiduamente aos telejornais, exceto, os de caráter sensacionalista. Gosto do telejornal que apresenta o fato, ao invés de apenas noticiá-lo. Esse tipo de telejornal traz um teor nem sempre perceptível aos olhos e ouvidos da maioria do telespectador; sua preocupação, segundo o/a editor/a é com a verdade e a imparcialidade. É disso que gosto. Que verdade? A serviço de quem a verdade é enunciada? Qual a função da verdade enunciada? 

Esses três questionamentos permitem ao/a telespectador/a perceber o não dito, ou seja, aquilo que em nenhum momento é enunciado no telejornal, mas é impresso no imaginário coletivo do/a telespectador/a, ou seja, a tal verdade. 

Quando apresentam sobre MANIFESTAÇÕES populares, e nessa lista estão os PROTESTOS de professores/as, estudantes, servidores/as públicos, moradores/as de comunidades e grupos sociais que reivindicam direitos, a grande imprensa tende a chama-los e aos desdobramentos deles decorrentes de CONFUSÃO, principalmente quando os que protestam revidam a violência cometida pelo Estado através da polícia.

As MANIFESTAÇÕES populares e os PROTESTOS contra algo que fere a dignidade humana é um exercício de POLITIZAÇÃO. Só pessoas politizadas, conscientes dos seus direitos e deveres, ou seja, cidadãos de direito e fato são capazes de ir as ruas, protestar e reivindicar do Estado o que lhes são negados. Mas nem sempre a grande imprensa brasileira os concebe assim e produz um discurso desqualificante que criminalizam-nos.

Hoje 30 de dezembro de 2019, assisti a uma reportagem que tratou da aprovação da Reforma da Previdência dos Servidores/as Públicos Municipais da cidade de Campina Grande. O teor da matéria não foi a reforma da previdência municipal em si, mas a MANIFESTAÇÃO, PROTESTO organizado pelos servidores/as públicos municipais dessa cidade que ocuparam a Câmara Municipal por entenderem ser a tal reforma prejudicial as suas vidas futuras. Mas no discurso do telejornal os/as servidores/as promoveram uma CONFUSÃO. 

Assim o direito político dos dos/as servidores/as de manifestar-se contra a aprovação de uma lei que os prejudicará; em poucos minutos, o discurso da imprensa transformou em CONFUSÃO. Na reportagem apresentada, a palavra mais enunciada fora CONFUSÃO, ao invés de POLITIZAÇÃO. Aqueles homens e mulheres que foram à Câmara Municipal de Campina Grande protestar só foram porque são politizados. Mas no discurso da grande imprensa foram criminalizados.

Assim o telejornal imprimiu no imaginário social dos paraibanos a representação de que toda pessoa que se manifesta e protesta contra os atos dos parlamentares que lhes são prejudiciais faz CONFUSÃO e não POLÍTIZAÇÃO. Cometem crime contra a ordem.

O mesmo segmento da imprensa brasileira que produz um discurso que criminaliza os PROTESTOS, MANIFESTAÇÕES e a POLITIZAÇÃO dos/as brasileiros/as contra a reforma da previdência é o mesmo que trata o fato de os franceses, italianos e tantos outros europeus irem as ruas contra as reformas da previdência em seus países como PROTESTOS e MANIFESTAÇÕES POLITICAS.  

No Brasil MANIFESTAÇÃO e PROTESTO POPULAR, não rima com POLITIZAÇÃO, mas com CRIMINALIZAÇÃO.


Por Waldeci Ferreira Chagas -  Doutor em História pela UFPE - Atualmente professor do Departamento de História da UEPB - CAMPUS III - Guarabira. 

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