COLUNA DA MAGNOLIA: SÉRIE DIREITO E CINEMA: “A Condenação” (2010) Nosso sistema está livre de desvios?

(É recomendado ver o filme ou ler a sinopse antes de ler este artigo)

No filme, Kenny várias vezes é perseguido pela polícia por já ter ficha suja, mesmo não havendo nenhum indício da autoria de Kenny sobre novos crimes. Tal situação já nos proporciona dizer que nosso sistema tende a esteriotipar um tipo de criminoso antes mesmo de ele existir. Ou seja, a reincidência de crimes cometido por Kenny fez com que a suspeita de assassinato caísse diretamente sobre ele. Em um nível sociológico, a reincidência de criminosos pobres, e sem assistência social cria um vício das autoridades em olhá-los como culpados antes mesmo de qualquer suspeita.

Há de se convir que o Direito é um exercício sofista, quase um exercício sofisticado de oratória. Tal natureza faz da hermenêutica jurídica e da produção de provas os pilares para o “sucesso” da ideia que se pretende defender. Entretanto, “sucesso” por muitas vezes nada tem a ver com “verdade”, e “justiça”.

O fato de a irmã de Kenny ter de terminar o curso de Direito, para depois libertar o irmão da cadeia, mostra que o Direito ainda é uma espada na mão dos que possuem recursos para acessá-lo, e que o acesso a justiça é muitas vezes desigual, devido a alta demanda da população pobre, além de outros fatores como desgaste psicológico, dificuldade de locomoção aos órgãos públicos, menor conhecimento. (Weber).

Especialmente, a falta de conhecimento delegada aos menos favorecidos – esta resultante da péssima assistência social - é o principal excludente no que tange o acesso à justiça pelos menos afortunados. A irmã de Kenny buscou conhecimento. Com o conhecimento jurídico adquirido, ela pode exercer o sofismo da advocacia e tentar libertar o irmão Kenny.

Goldschmit ensina que: “quando a guerra (início do processo) estoura, tudo se encontra na ponta da espada; os direitos mais intangíveis se convertem em expectativas, possibilidades e obrigações, e todo direito pode se aniquilar como consequência de não ter aproveitado uma ocasião ou descuidado de uma obrigação;como, pelo contrário, a guerra pode proporcionar ao vencedor o desfrute de um direito que não lhe corresponde”

Dessa forma, a irmã de Kenny deveria, e sabia que a liberdade do irmão dependia de um jogo de circunstancias e oportunidades, que poderiam levar a um resultado satisfatório, sendo ele justo ou não. Ela então começou tal jogo.

Quando a famigerada guerra (início do processo) a que se refere Goldschmith começa, o resultado se revela de acordo com as possibilidades de ação dentro do processo pelos operadores de direito, e o respectivo “aproveitamento” das mesmas a seu favor.

Dessa forma, desenha-se um panorama onde a insegurança jurídica predomina. Desse modo, o instrumento da jurisdição; o processo, que deveria conferir segurança jurídica aos indivíduos de uma comunidade, vira um joguete na mão dos operadores de direito e quem tem poder econômico ou político sobre eles. Os ricos, obviamente.

Assim, as cadeias se enchem de pobres e negros e favelados, mostrando um problema social latente no sistema judiciário, que todos parecem ignorar.

Portanto, conclui-se que nosso sistema não está livre de desvios.

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