Bolsonaro mantém emendas polêmicas do relator à LDO de 2022
O presidente Jair Bolsonaro sancionou a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2022, com vetos aos R$ 5,7 bilhões do Fundo Eleitoral aprovado pelo Congresso, conforme publicado ontem no Diário Oficial da União (DOU). Contudo, manteve as polêmicas emendas do relator-geral, que causaram problemas na negociação do Orçamento deste ano, estourando os limites das regras fiscais e obrigando o Palácio do Planalto a avaliar vetos para que o chefe do Executivo não cometesse crimes de responsabilidade.
A manutenção desse expediente evidencia o enfraquecimento de Bolsonaro junto à base aliada. E aumenta as preocupações de especialistas em contas públicas, porque vai na contramão da transparência para a distribuição dos recursos do contribuinte.
“A manutenção da possibilidade de emendas do relator-geral é preocupante porque fere a lógica do arcabouço orçamentário. Já vimos os problemas que essas emendas podem ter por serem genéricas. Seria importante que fossem concentradas nas individuais e de bancadas, que estão regulamentadas pela Constituição”, avaliou Felipe Salto, diretor-executivo da Instituição Fiscal Independente (IFI). Mas ele elogiou o veto aos R$ 5,7 bilhões do Fundão Eleitoral.
Na última sexta-feira, quando anunciou o veto ao fundão, Bolsonaro disse que também vetaria as emendas de comissão permanente e de relator-geral do orçamento (RP-8 e RP-9), mas voltou atrás para não desagradar totalmente à base aliada.
Essas emendas foram alvo das denúncias do “orçamento secreto”, negociado com o Centrão para vitória dos candidatos apoiados pelo Planalto às presidências da Câmara e do Senado. Esse expediente, inclusive, foi questionado pela oposição em um processo aberto no Tribunal de Contas da União (TCU).
“As emendas parlamentares somaram R$ 35,5 bilhões no Orçamento deste ano, o equivalente ao valor de um Bolsa Família. São recursos de relevante magnitude. E as emendas do relator-geral, ocupam um espaço importante desse volume, de R$ 18,5 bilhões”, destacou o especialista em contas públicas Leonardo Ribeiro, economista do Senado. As emendas individuais somaram R$ 9,7 bilhões e as de bancada, R$ 7,3 bilhões.
De acordo com o secretário-geral da Associação Contas Abertas Gil Castello Branco, as emendas de relator constituem atualmente num “jogo de esconde-esconde”, entre Executivo e Legislativo, “para não dar transparência à relação, historicamente promíscua, entre os poderes Legislativo e Executivo”. Segundo o economista, o que era ruim tem ficou pior.
“O custo do apoio político a um presidente fragilizado e com a popularidade em queda livre tem aumentado”, explicou. Para ele, é preciso que fiquem claros os critérios de seleção dos parlamentares contemplados, a forma de distribuição dos valores e quem são os verdadeiros autores das “emendas de relator”.
Pessimismo
A crise institucional entre Bolsonaro e o Supremo Tribunal Federal (STF), e as incertezas em torno do PLOA de 2022, tornam as previsões para os indicadores econômicos do ano cada vez piores. O clima de tensão aumentou porque o governo foi na contramão das regras fiscais e da Constituição a fim de tentar aumentar espaço no Orçamento para as medidas eleitoreiras — como a PEC que adia o pagamento de precatórios, considerada inconstitucional por especialistas.
“O governo partiu para medidas que fragilizam as regras fiscais e não conseguiu organizar as contas públicas aproveitando o momento de juros baixos para reduzir o estoque da dívida pública. Agora, com a escalada dos juros devido ao aumento da desconfiança, o fiscal tende a ficar muito pior”, alertou a especialista em contas públicas Juliana Damasceno, pesquisadora do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas.
“A crise política tem piorado e há uma expectativa de atrasos nas reformas, o que deixa o fiscal meio na berlinda. O medo de uma deterioração fiscal é muito grande e isso está refletindo nos juros e no câmbio, que estão subindo”, alertou o economista-chefe da Sul-América Investimentos, Newton Rosa.
Centrão quer Fundão de R$ 4 bilhões
O Palácio do Planalto abriu negociações com o Congresso com o objetivo de fechar um novo valor para o Fundo Eleitoral, que poderá ser previsto no Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) de 2022. No que depender dos parlamentares do Centrão, o montante deve ficar em torno de R$ 4 bilhões, mas analistas acreditam que a cifra ainda precisará ser negociada durante a tramitação do projeto de lei orçamentário no Parlamento. O governo precisa enviar o PLOA ao Legislativo até o próximo dia 31, porém tudo indica que essa negociação deve se estender pelo segundo semestre, de acordo com técnicos do legislativo.
Ao vetar o Fundão de R$ 5,7 bilhões na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), publicada ontem no Diário Oficial da União (DOU), o presidente Jair Bolsonaro disse que proporia o valor de 2020, de R$ 2 bilhões, corrigido apenas pela inflação no PLOA. Mas o tamanho do fundão dependerá das negociações das emendas parlamentares e demais despesas. Todas precisam caber no Orçamento que, de acordo com a LDO, prevê uma meta fiscal permitindo um rombo de até R$ 170,4 bilhões nas contas do governo central — que inclui Tesouro Nacional, Banco Central e Previdência Social.
Conforme especialistas, é preciso que Executivo e Legislativo entrem em acordo para fechar as contas, respeitando as regras fiscais vigentes. “Esse valor vai depender do que for discutido, e é importante definir com clareza os critérios para o financiamento das campanhas. O limite para o fundão precisará ser definido por meio de um consenso, mas é imprescindível que os critérios sejam transparentes, e as regras fiscais, respeitadas”, avaliou o especialista em contas públicas Leonardo Ribeiro, economista do Senado.
Para o deputado e líder do Novo na Câmara, Paulo Ganime (RJ), Bolsonaro tentou se aproveitar do veto do fundão pensando que a opinião pública iria poupá-lo por ter freado o tema mais polêmico. “Ele já está cedendo às pressões do Centrão e dos interesses políticos há tempos, isso é só mais um gesto nessa direção”, disse. Na avaliação do parlamentar, o ideal seria mudar a lei para acabar com o fundo eleitoral. Entretanto, enquanto isso não acontece, é esperado que Bolsonaro mantenha o mínimo legal, de R$ 800 milhões, sobretudo por conta da pandemia. “Ainda é um momento delicado e com uma crise fiscal muito agravada por conta das ações que foram colocadas em prática nesse último um ano e meio.”
Gil Castello Branco, secretário-geral da Associação Contas Abertas, destacou que, por conta das discussões sobre o Orçamento, o mercado poderá ficar ainda mais pessimista. “A crise institucional e política agrava muito o cenário econômico. A economia comporta-se em função de fatos e de expectativas. Como o presidente da República gera uma crise diária — institucional e política com efeitos fiscais —, podemos estar às vésperas de um ‘tsunami’ perfeito”, frisou.
Para ele, o fundão deverá ficar em cerca de R$ 4 bilhões. Os R$ 5,7 bilhões eram o bode na sala. “Os R$ 4 bilhões, a meu ver, contentarão o Centrão, mas é um valor elevado. Representa, por exemplo, duas vezes o valor do Censo Demográfico que deixamos de realizar há dois anos sob a justificativa de que faltam recursos”, destacou.
Por: Rosana Hessel; Cristiane Noberto
Fonte: Correio Braziliense
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